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Moedas De Ouro Do Milénio Português
A história de Portugal com base numa seleção de moedas cunhadas no país entre o século XII e os nossos dias.

O Museu Casa da Moeda conta-lhe a história de Portugal com base numa seleção de moedas cunhadas no país entre o século XII e os nossos dias. Trata-se de uma exposição temática que mostra ao público uma seleção exclusiva de moedas de ouro representativas de cada século da história nacional. São, no total, 10 moedas que contam a história do primeiro “milénio português”, do morabitino de D. Sancho I ao euro da República Portuguesa.

Século XII: O Morabitino de D. Sancho I (MCM 4235)

Ouro • 27 mm • 3,66g

Armado cavaleiro pelo pai após o desastre de Badajoz, D. Sancho I procurou consolidar a fronteira com a Galiza, a norte, e continuar a guerra com o islão, a sul, tendo conseguido conquistar a cidade de Silves, um dos bastiões da presença almóada no Gharb al-Andalus, com o apoio de uma frota que seguia para a cruzada do oriente. Selada a aliança com Aragão e Roma, D. Sancho I dedicou a sua atenção à organização do povoamento e do território, fundando cidades como a Guarda ou concedendo cartas de foral às já existentes, em especial na Beira e em Trás-os-Montes. A moeda que marca o seu reinado, o morabitino, a primeira moeda de ouro cunhada em Portugal, apresenta todas as caraterísticas de uma peça produzida para uma monarquia cristã, apesar de o seu nome ser de origem árabe.  

Numa face, o rei surge representado de coroa na cabeça, com barba longa, segurando um cetro com cruz numa mão e uma espada na outra, montado num cavalo aparelhado e preparado para a guerra.

 Na outra face, o escudo do reino é constituído por um conjunto de cinco escudetes postos em cruz, cada um dos quais carregado com quatro besantes em aspa, cantonados por quatro estrelas de sete pontas, formando uma das mais antigas representações do brasão de armas do reino. Os letreiros estão divididos pelas duas faces da peça e correspondem à fórmula através da qual se invoca a Santíssima Trindade e se menciona o nome do rei: “Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ámen. Sancho, rei de Portugal”.

Morabitino

Século XIII: O Morabitino de D. Sancho II (MCM 22945)

Ouro • 23mm • 3,25g

No século XIII, D. Sancho II deu continuidade à política de emissão em ouro que tinha sido desenvolvida pelo pai, D. Afonso II, e ordenou a cunhagem de um novo morabitino, moeda que já circulava nos cofres do reino desde os finais do século XII. À semelhança da anterior, esta moeda foi batida num momento importante da história de Portugal, marcado, por um lado, pela guerra com o islão, na qual se destacou a Ordem de Santiago; por outro, pelos conflitos com o clero, em especial o arcebispo de Braga e os bispos de Lisboa e Porto; por fim, pela guerra civil que opôs o rei ao irmão mais novo, D. Afonso, que terminaria com a sua própria deposição.

No morabitino, D. Sancho II aparece representado com coroa e barba, atributos muito caraterísticos dos reis medievais, montado num cavalo aparelhado e trazendo uma espada longa numa das mãos. Na outra face, o escudo do reino continua a ser o tema dominante, embora surja cantonado por três estrelas e uma cruz. Nesta moeda, a imagem de D. Sancho II personifica um ideal de realeza guerreira e está associada ao seu brasão, símbolo que o rei herdou dos seus antepassados e que se tornaria num emblema do próprio reino. Por comparação com o morabitino velho, os letreiros do morabitino novo alteram-se: perde-se a referência à Santíssima Trindade e introduz-se a fórmula “Moeda do senhor Sancho, rei dos portugueses.” Dizemos que este letreiro é de caráter autorreferencial porque põe a moeda a falar de si própria, atribuindo-lhe um nome e referindo quem a cunhou.

Morabitino

Século XIV: A Dobra Pé-Terra De D. Fernando I (MCM 4282)

Ouro • 28mm • 5,05g

A crise que atravessou a Europa durante o século XIV, de que a peste negra foi talvez o episódio mais marcante, também se fez sentir em Portugal. O reinado de D. Fernando foi muito turbulento: travaram-se guerras a propósito do trono de Castela e alguns setores populares reagiram negativamente ao casamento do rei com D. Leonor Teles de Meneses. Restabelecida a paz social, D. Fernando dedicou alguma atenção à administração do reino: ordenou a construção ou a reparação de vários castelos e muralhas, como em Lisboa e no Porto; promulgou a lei das sesmarias, com a qual procurou fomentar a agricultura; alargou as redes comerciais com o estrangeiro e promoveu o desenvolvimento da marinha.

A morte do rei, sem descendência, abriu o caminho à regência de D. Leonor, apoiada pelo rei de Castela, e à oposição de alguns setores da sociedade, que se organizaram à volta de D. João, mestre de Avis: a crise dinástica instalou-se entre 1383 e 1385. Apesar disso, foi durante o reinado de D. Fernando que se assistiu a uma grande diversificação das espécies monetárias que circulavam no território português, sinal de uma economia que procurava revitalizar-se a todo o custo. Data desta época a cunhagem da dobra pé-terra, em que o rei, influenciado pela moeda francesa, se faz representar de pé, coroado e couraçado, segurando uma espada na mão e o escudo com o brasão de armas do reino na outra, enquadrado por um cenário tipicamente gótico. Na outra face surge uma cruz equilateral ricamente ornamentada segundo o modo gótico. Os letreiros dizem “Fernando, por graça de Deus, rei de Portugal e dos Algarves.”

Dobra Pé Terra

Século XV: O Justo de D. João II (MCM 4881)

Ouro • 30mm • 5,96g

No século XV, a coroa portuguesa deu passos decisivos na exploração do território africano: dando continuidade à ação do infante D. Henrique, D. João II centralizou na coroa o comércio do golfo da Guiné e da costa da Mina, ao mesmo tempo que incentivou as explorações que levaram à descoberta da foz do rio Congo por Diogo Cão, a travessia do Cabo da Boa Esperança por Bartolomeu Dias e as expedições de Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva à terra do preste João. Outro acontecimento muito importante foi a assinatura do Tratado de Tordesilhas, com o qual os monarcas ibéricos acordaram a divisão do mundo entre Portugal e Espanha, fixando as respetivas áreas de jurisdição.

A moeda mais emblemática do seu reinado é o justo: nela, D. João II aparece retratado em toda a sua majestade, em posição frontal, sentado num trono, de coroa na cabeça, manto a cobrir o corpo e espada longa na mão direita. 

Esta imagem do poder régio é complementada pela presença do brasão de armas do reino, símbolo da soberania nacional, constituído por escudo enquadrado por volutas e formado por cinco escudetes postos em cruz, carregados com cinco besantes em aspa, com bordadura de sete castelos. Os letreiros citam a fórmula sálmica “O justo florescerá como a palma” e o título do monarca, aqui designado “João II, rei de Portugal e dos Algarves, senhor da Guiné.” O título do rei inclui o algarismo “2”, muito raro nas moedas desta época.

Justo

Século XVI: O Português de D. Manuel I (MCM 4906)

Ouro • 35mm • 35,35g

No século XVI, Portugal vive um período de grande prosperidade económica, fruto da sua integração nas rotas transoceânicas que, ligando a Europa, a África e a Ásia, punham em circulação produtos tão importantes como o ouro africano ou as especiarias asiáticas. “D. Manuel I, rei de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além-mar em África, senhor da Guiné, da conquista, navegação e comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia” foi o rei que, com este impressionante título, o mais extenso utilizado até então, se fez representar na moeda que marca simbolicamente esta época – o português.

Batida em ouro, esta moeda capta a essência de um projeto imperial ligado à epopeia dos descobrimentos e da expansão, de que a chegada de Vasco da Gama à Índia, o achamento do Brasil por Pedro Álvares Cabral ou a conquista de Goa por Afonso de Albuquerque foram três momentos importantes. Numa face, o brasão de armas do reino representa a ideia de soberania nacional; na outra, a cruz da Ordem de Cristo mostra o papel desempenhado por esta ordem religiosa na história marítima. Moeda de grande prestígio, o português chegou a ser imitado em várias cidades do norte da Europa e foi até utilizado, devido à sua evidente carga simbólica e propagandística, como instrumento diplomático ao serviço da corte régia. A sua influência foi de tal forma grande que, já no século XVIII, também D. João V procurou recuperar a sua produção para efeitos de cerimonialização do poder régio.

Português

Século XVII: O Cruzado de D. João IV (MCM 5156)

Ouro • 20mm • 2,99g

Após a aclamação de D. João IV como rei, acontecimento que pôs fim a sessenta anos de domínio espanhol, Portugal teve de resolver vários problemas relacionados com a sua afirmação na cena política internacional. A Guerra da Restauração, travada ao longo de mais de vinte anos, ficou marcada por quatro desafios importantes: o reconhecimento da independência de Portugal, a legitimação da casa de Bragança como dinastia reinante, a defesa das fronteiras territoriais com Espanha e a recuperação das colónias perdidas para as Províncias Unidas dos Países Baixos no Brasil. Nesta época foi também cunhada uma nova moeda, o cruzado, com a qual o rei procurou dar resposta à necessidade de recuperar uma economia fragilizada por anos de uma prolongada guerra.

Na face primária desta moeda, vê-se o brasão de armas do reino, formado por escudo com cinco escudetes postos em cruz e bordadura de sete castelos, encimado por coroa; na face secundária, a cruz de braços equilaterais com ponto ao centro, também conhecida como cruz de São Jorge, cantonada pela data de cunhagem: 1647. A cruz evoca uma das mais antigas devoções portuguesas, ligada a episódios célebres da história nacional como a conquista de Lisboa por D. Afonso Henriques, com o apoio dos cruzados ingleses, em 1147, ou a entrega da insígnia alusiva ao santo mártir aos combatentes da batalha de Aljubarrota, entre os quais o condestável Nun’Álvares Pereira, em 1385. Nesta moeda, os letreiros correspondem ao título de D. João IV, identificado apenas como “rei de Portugal”, e ao lema “Neste sinal vencerás”, a fórmula mais frequente nas moedas que foram cunhadas pelos reis da casa de Bragança até à implantação da república em Portugal. 

Cruzado

Século XVIII: O Dobrão de D. João V (MCM 5334)

Ouro • 39mm • 53,68g

A chegada das primeiras remessas de ouro vindas do Brasil, nos finais do século XVII, inaugurou um período de grande prosperidade em Portugal. No reinado de D. João V, o rei por excelência da época barroca, o país recuperou a sua imagem como potência europeia e cabeça de um império cada vez mais interessado na aposta atlântica: de facto, as posses em África e na Índia tinham vindo a perder-se como resultado da entrada na corrida marítima de várias nações europeias, como os espanhóis, os holandeses, os franceses e os ingleses.

D. João V interveio na Guerra de Sucessão de Espanha e procurou consolidar a sua posição junto da Santa Sé, alargando as redes formais e informais de poder que se tinham construído à volta da figura do monarca absoluto, homem de grande poder e prestígio. Durante o seu reinado foram não só construídos edifícios que ainda hoje se podem admirar em Lisboa ou nos seus arredores, como o Convento de Mafra e o Aqueduto das Águas Livres, mas também patrocinadas as artes, as letras, as ciências, a indústria e o comércio.

Produzida em 1726, a moeda que ficou conhecida como dobrão, um dos símbolos do ciclo do ouro, é também um dos mais marcantes testemunhos desta época marcada pela riqueza, a opulência e o esplendor. Numa face surge o brasão de armas do reino, formado por escudo com cinco escudetes postos em cruz, carregados com besantes em aspa e enquadrados por bordadura de sete castelos; acima, aparece uma coroa decorada com pérolas e pedras preciosas, rematada por uma cruz. Na outra face surge a cruz da Ordem de Cristo, cantonada por quatro letras monetárias alusivas ao local de cunhagem: Minas Gerais, terra do ouro e de muitas riquezas artísticas e arquitetónicas. Os letreiros referem o monarca como “João V, por graça de Deus, rei de Portugal e dos Algarves” e incluem a típica alusão ao lema “Neste sinal vencerás.”

Dobrão

Século XIX: A Peça (“Degolada”) de D. Maria II (MCM 5585)

Ouro • 32mm • 14,22g

No século XIX, Portugal vivia um período muito importante da sua história, marcado não só pelas lutas entre liberais e absolutistas, representados respetivamente por D. Pedro IV e D. Miguel, mas também pela promulgação da primeira legislação de cariz constitucional no país oitocentista. Nascida no Brasil, D. Maria II subiu ao trono após a abdicação do pai e chegou a casar com o tio, que tinha chegado a Lisboa, vindo do estrangeiro, para jurar fidelidade à carta constitucional. Ao longo do seu reinado, o país atravessou uma grave crise económica e financeira, coeva das lutas que opuseram os grupos políticos de matriz cartista e vintista.

Ciente de que a questão devia ser sanada juridicamente, D. Maria II tentou promulgar vários diplomas com o objetivo de pôr termo à crise, embora sem ver grandes efeitos: de facto, o seu governo caraterizou-se por uma série de golpes revolucionários e contrarrevolucionários que mostram bem as dificuldades da transição do absolutismo para o constitucionalismo. Com a sua efígie foi cunhada, em 1833, esta peça de ouro, também conhecida como “degolada” devido à inusitada representação da cabeça da rainha, sem busto. Numa das faces surge o seu rosto com feições ainda jovens, com um elaborado penteado. Na outra face surge o brasão de armas do reino, com configuração tipicamente oitocentista, enquadrado por dois ramos entrelaçados. Para além da data da cunhagem, os letreiros identificam a monarca como “Maria II, por graça de Deus, rainha de Portugal e dos Algarves.” Peça emblemática desta época, a “degolada” é ainda hoje muito apreciada pelos colecionadores de moedas.

Peça

Século XX: O Último Escudo (MCM 28522)

Ouro • 4,56g

Produzido para substituir a moeda de réis cunhada na época monárquica, o escudo foi a espécie monetária que circulou em Portugal entre os inícios do século XX, data da implantação da república, e os inícios do século XXI, data do aparecimento do euro. Ao longo destes cem anos de história, o escudo conheceu vários temas e configurações, associados aos vários períodos em que a história contemporânea se divide: a Primeira República, o Estado Novo, a Democracia.

A peça que lhe mostramos na imagem, idealizada por Helder Batista, corresponde à última emissão de escudo, em ouro, antes da entrada em circulação do euro: numa das faces vê-se a indicação do valor e da denominação; na outra vê-se o brasão de armas da República Portuguesa, formado por escudo com cinco escudetes postos em cruz, carregados com cinco besantes em aspa e enquadrados por bordadura de sete castelos. No local onde, nas moedas da época monárquica, surgia a coroa, aparece agora um nó de corda que evoca um dos motivos mais comuns na arte portuguesa do período manuelino, intimamente ligada ao tema do mar e da navegação. Os letreiros identificam a autoridade responsável pela emissão e a data em que esta ocorreu: 2001. Embora a sua produção tenha sido interrompida nesta altura, a moeda continuou a circular ainda durante alguns anos, até ser recolhida por ordem do Banco de Portugal.

Escudo

Século XXI: O Primeiro Euro

Ouro • 30mm • 17,50g

A criação de uma moeda única no espaço europeu foi um momento muito importante na história da União Europeia e dos países que a integram, entre os quais Portugal. A produção desta moeda é um desafio que está a cargo de muitos artistas e técnicos que trabalham diariamente em colaboração com as várias casas da moeda europeias. Nas suas denominações, o euro apresenta uma face comum a todos os países da União Económica e Monetária e uma face nacional específica de cada país: Luc Luycx foi o autor do desenho alusivo ao mapa da União Europeia com as doze estrelas da bandeira, e Vitor Santos, o autor do desenho alusivo aos selos de D. Afonso Henriques, com as quinas e os castelos que formam o brasão da República.

Em Portugal, a primeira moeda de euro, já em ouro, foi produzida um ano depois da entrada da nova moeda em circulação, assinalando uma data muito importante da história filatélica portuguesa: os 150 anos da emissão do primeiro selo. Este selo foi produzido durante o reinado de D. Maria II, em 1853, e é hoje um objeto muito cobiçado por todos os colecionadores filatélicos, devido à sua grande raridade e valor histórico. Nele, a rainha fez-se retratar à esquerda, com um diadema na cabeça e cabelos presos num delicado penteado, à moda das elites do século XIX. Acima da efígie da rainha, pode ler-se a palavra “Correio”, uma instituição que foi criada nos inícios do século XVI e que ainda hoje se mantém ativa, cumprindo a sua missão de assegurar soluções de comunicação, logística e produtos financeiros baseadas na inovação e na confiança.